ÚNICO: será que isso tem um fim?
ESCREVO EM MEIO AO DESESPERO PORQUE escrever sempre foi o jeito que eu encontrei de escapar da vida. O que é um problema, porque a vida não devia ser algo do qual eu quisesse escapar. Mas eu estou constantemente tentando fugir de algo: se não é de viver, é de mim mesma.
Eu não estava planejando postar isso, mas quando o mundo começa a cair em cima da sua cabeça, é difícil resistir ao instinto de sobrevivência. Normalmente quando o mundo está caindo (ou seja, sempre), eu ignoro e finjo que nada acontece, mas quando a queda te acerta em cheio e é difícil de respirar embaixo de todo aquele peso, é impossível de ignorar e seguir como se nada tivesse acontecido. Eu deveria me arrastar pra fugir? E como ignorar todos os arranhões e feridas abertas?
Não me sinto preparada pra me recuperar e continuar.
Digo isso porque a ansiedade não me deixa em paz. A cada dia que passa é como se tudo ficasse pior, principalmente porque não tenho pessoas a quem recorrer. Falar dos meus problemas? Conversar sobre eles? Dizer como me sinto? São coisas difíceis, principalmente quando você se sente sendo ignorado a todo momento. As pessoas ignoraram como você se sente, e com elas, você aprende a se ignorar também.
Sempre me ignorei, na verdade. Me ignoro até que todas as coisas que eu fingi que não vi comecem a me comer viva. Ignoro a ansiedade até ela se tornar insuportável, e quando ela se torna insuportável, eu tenho que jogá-la pra longe, exatamente o que eu estou fazendo agora. Não jogo longe falando sobre ela com outras pessoas, mas a jogo longe a prendendo em algum lugar. O lugar da minha ansiedade agora é aqui, e é aqui onde eu vou guardá-la até o momento em que ela me preencher de novo e eu precisar tirá-la de dentro de mim de novo e guardá-la em outro lugar de novo. É cansativo. Pelo menos o meu coração segue intacto, já que há tempos ele não tá dentro de mim, e sim em outro lugar. Pelo menos sei que ele tá bem guardado e bem cuidado. Mas quanto mais eu sou derrotada, mais de mim eu perco pra sempre.
Acho que há muito tempo eu não sou mais eu mesma.
2024 está sendo o pior dos anos desde o primeiro dia, literalmente. Lembro de coisas que aconteceram na virada que me deixaram marcas até hoje. Às vezes é assim que me enxergo, uma grande marca ambulante. Carrego tantas coisas que muitas vezes estagno no meio do caminho, sem forças. Eu não tenho forças pra mais nada. Eu não sou forte. Nunca fui.
Foram eles que me enfraqueceram por tanto tempo. Agora parece impossível eu mostrar o pouco que tenho de mim ao mundo. Mas também é difícil suportar quando eu quero mostrar e simplesmente ninguém quer ver. E ninguém quer realmente me ver, por isso me mantenho invisível, me mantenho fácil, me mantenho simples. Quem é que liga? Quem se importa? Ninguém nunca se importou. Tantas pessoas que já foram embora, tantas pessoas que me deixaram que agora eu não consigo suportar a possibilidade de mais alguém fazer isso, mesmo que não esteja exatamente fazendo. O que é que eu posso fazer diante de tudo isso? Como lidar com o mundo constantemente caindo bem em cima de mim? Como lidar com o fato de que eu vou ser uma pessoa sozinha até o dia em que eu não estiver mais aqui? Lidar com o fato de que eu não tenho nada de mim pra dividir com as pessoas, porque tudo o que eu carrego em mim não é sobre quem eu sou, e o pouco que eu ainda tenho de quem eu sou eu não posso dividir com ninguém.
Porque ninguém quer os restos, ninguém quer uma marca ambulante.
É tão desesperador ter um histórico de automutilação porque, quando a ansiedade aparece, os punhos são os primeiros a dar coceira. Parece que o corpo fisicamente pede pra que você faça isso, mesmo que a mente diga não não e não. Mas não porque ela não quer, mas porque como eu vou esconder depois? Mas porque e se eu não parar mais? Mas porque e se tudo isso aumentar e no final não for o que eu queria? Mas ao mesmo tempo não tem um dia em que eu não me encare de volta e não pense na possibilidade, e não pense que "vai ser só uma vez", "eu não vou me machucar muito", "é só superficial" e "eu preciso tanto disso". Às vezes eu acho que esses pensamentos vão ganhar, mas eu ainda não permiti. Já faz quatro ou cinco anos que eu não faço isso e não lembrar da sensação é algo que ajuda. Ainda não me decidi se isso é bom ou ruim.
Não sei o que eu quero. Talvez eu queira que tudo fique bem logo. Talvez eu queira que tudo isso acabe logo. Talvez eu queira saber lidar com isso. Talvez eu só queira sumir pra sempre. Talvez eu queira ajuda. Talvez eu não queira. Afinal, quem vai me ajudar? Quem quer me ajudar? Quem quer ter que ouvir sobre isso? Ninguém quer, porque eu também não queria ouvir essas coisas na minha cabeça a todo momento.
Eu tô ansiosa. Eu tô mal. Eu tô triste. Eu tô angustiada. Eu tô desesperada. Eu tô completamente sozinha. Meu papel sempre foi ajudar as outras pessoas, e não ser ajudada. Não sei porque ainda desejo algo que eu não posso ter.
Ninguém quer uma coisa quebrada. Ninguém quer a história dos cacos de vidro. Ninguém quer ouvir uma voz que não fala. Mas antes de quebrar, a coisa era inteira, os cacos eram copo, a voz ainda falava. Eu sempre tive um prazo de validade. Nunca me escolheram pra sempre, era só quando eu ainda prestava, quando eu ainda servia pra alguma coisa, quando eu não estava quebrada. Pra manter as pessoas por perto, eu sempre preciso de máscara e fantasia.
Quando paro pra pensar, sei que essas pessoas têm muita sorte. Porque eu mesma nunca me escolhi, e nunca quis. Mas escolhendo ou não, ainda preciso ficar com o que não serve mais: comigo mesma. Talvez um dia eu olhe pra trás e pra tudo isso e, se eu me amar um pouquinho mais, eu pense que eu ainda valia a pena, que eu ainda poderia ser amada, mesmo que não pelas outras pessoas e apenas por mim mesma. Mas agora eu não enxergo nada, não ouço nada, não falo nada, e penso de muito. Estou em uma eterna escuridão e sabe-se lá se vou conseguir sair dela, ou se ela vai sair de dentro de mim.
— HILLO
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